Varejo do Futuro: diferente, mas igual

O varejo eletrônico, o Ominichannel, a realidade aumentada, os iBeacons, a realidade virtual, os aplicativos, e por aí vão as bases para as projeções do que será o varejo no futuro, que invariavelmente concluem que o varejo no futuro será muito diferente do que conhecemos hoje. Mas será que as mudanças serão assim tão profundas a ponto de reinventar o varejo?

Um bom exercício de futurologia é olhar o passado e entender como a evolução vem ocorrendo ao longo do tempo.

O seriado Mr. Selfridges da Netflix, relata o poder inovador do seu fundador Harry Gordon Selfridge, que deu o nome à loja de departamentos fundada em 1909 ainda hoje uma referência em Londres e no mundo.

A história relata seu poder criativo e transgressor e o impacto que trouxe ao varejo da época, com sua visão baseada no atendimento e na satisfação do cliente, na perspectiva que deveria motivar os desejos e não as necessidades de compra, estabelecendo assim novos padrões para o setor.

Fez sua carreira inicialmente como funcionário da Marshall Field nos Estados Unidos e foi o primeiro a promover as vendas de Natal com a frase “Faltam _____ dias de compras até o Natal”, um slogan que foi rapidamente acompanhado por varejistas em outros segmentos. A ele é creditada a popularização da frase “O cliente tem sempre razão”.

Já a partir de sua inauguração, na extremidade ocidental da Oxford Street, a loja foi amplamente promovida por meio de publicidade paga. Os pisos de lojas foram estruturados de modo que os bens poderiam ser mais acessíveis aos clientes. Havia elegantes restaurantes com preços modestos, uma biblioteca, leitura e escrita, quartos, salas de acolhimento especiais para clientes franceses, alemães, americanos e “coloniais”, uma sala de primeiros socorros, e uma sala relaxante, com luzes suaves, cadeiras confortáveis, e unidade de vidro isolante, todos destinados a manter os clientes na loja o maior tempo possível. Os membros da equipe foram treinados para estar à disposição dos clientes, estimulando as vendas, mas não de forma agressiva. Investiu fortemente em vitrines, ao criar cenografias e fazendo destas uma atração em si.

Mudou a exposição dos produtos agrupando-os por motivação de consumo e trazendo, por exemplo, a categoria de perfumes e cosméticos para a entrada da loja. Acompanhou a evolução dos consumidores e chocou a todos, ao iniciar a venda de vestidos prontos o que para a época era impensável, e criou também a lista de presentes de casamento.

Se adiantarmos o tempo em 100 anos, veremos que nos dias de hoje todas essas inovações ainda predominam no varejo e que muito do que foi criado lá, ainda se tenta implantar e muitas vezes são chamadas como inovações.

Os princípios da experiência de compras, do foco no cliente, no estímulo aos desejos, na exposição baseada no consumo e não nos produtos, a importância da motivação dos funcionários, o objetivo de encantar o cliente e dar-lhe uma experiência única ainda são os princípios do varejo.

Os encantamentos das inovações tecnológicas não podem ofuscar as bases do varejo. Varejo é um negócio de pessoas feito por pessoas para pessoas. Os princípios continuam os mesmos depois de 100 anos e continuarão nos próximos 100.

Vivemos numa era onde a tecnologia tem orientado mais e mais a vida das pessoas e as relações sociais, trazendo novos comportamentos, mas também novas formas de fazer as mesmas coisas.

As pessoas não começaram a se relacionar com os amigos e a contar o que tem feito com o surgimento do Facebook, apenas passaram a fazer isso de forma mais intensa e contínua.

O impacto da tecnologia na sociedade tem que ser acompanhado pelo varejo, mas grande parte das chamadas inovações consistem em fazer as mesmas coisas de forma diferente e melhor.

Com as mídias sociais e os aplicativos será possível conhecer melhor os clientes e comunicar-se de forma direta e frequente, o que particularmente amplia a abrangência de comunicação aos vários níveis de varejo.

As câmeras espalhadas pela loja permitem acompanhar em tempo real quantas pessoas passam pela rua e se encantam com as vitrines, quantas se motivam a entrar na loja, o que mais as atrai e ao mesmo tempo cria desejos que se transformam em compras. Algo que sempre se buscou conhecer, mas que nos dias de hoje é praticamente impossível sem a tecnologia.

O encantamento na loja será possível pela visibilidade do mundo real, mas também pela realidade aumentada dos equipamentos de 3D.

Como o BigData, será possível entender melhor o comportamento e os desejos de cada cliente e com isso ter um mix de produtos adequado bem como ações dirigidas a atender esses desejos individualmente.

E finalmente será possível em tempo real saber como anda a operação do negócio, as vendas, a performance dos funcionários, e as ações que devem dinamizar a atividade no dia a dia.

Essas mudanças trazem uma nova dimensão para a gestão do varejo que se torna cada vez mais desafiadora, principalmente na agilidade de promover mudanças e se adaptar à velocidade que os novos tempos impõem à sociedade, particularmente ao comportamento das novas gerações.

Sim, a tecnologia trouxe uma mudança de comportamento social que obriga o varejo a acompanhar esse novo ambiente ao incutir fortes mudanças na forma de gerir os negócios, mas a essência continuará a ser a mesma, fazer o mesmo, mas de forma diferente.


Prof. Dr. Francisco J.S.M. Alvarez

Prof. Dr. Marcos R. Luppe

Artigo publicado no Ranking 300 maiores varejistas do SBVC – 2017.

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